terça-feira, outubro 30, 2012

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Azeite de oliveira
do olival
do Mediterrâneo, Grécia, Roma
de Portugal
da civilização doce do sol
ocidental

nobre
não te misturas
pobre
não te alteras
altivo
não precisas de ajuda
virgem
és natureza
na tua simplicidade

Manuel Paes, in"De Fio a Pavio", pág.14, Tea For One, 2012

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domingo, outubro 28, 2012

Lisa says



"O que sei
da tua vida tão substantiva
é tudo aquilo que evitarei
por mais que viva."

Manuel Filipe, in "Via de Curetes", pág.46, Edição de Autor

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sexta-feira, outubro 26, 2012

Uma casa



A noite fechou-se
sobre as palavras
e por fora do estupor morno da casa
apenas alguns brilhos se pressentem,
as estrelas e o gelo na vidraça.

As luzes
apagam-se
a quem passa.

Manuel Filipe, in Via de Curetes", pág.19, Edição do Autor

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quarta-feira, outubro 24, 2012

24 de Julho



Anoitece.
Os pardais, ao poisar,
debatem-se nas copas floridas dos jacarandás
que estremecem
ao ganharem vida singular.

Flores lilases
tombam no basalto
impelidas pelos voos rápidos.

Sobem mais alto
lentos aromas ácidos
que aquecem brandamente
a festa vespertina.

Descola um bando de corvos
antes do cair da noite,
repentina.

Manuel Filipe, in"Via de Curetes", pág.55, Edição do Autor

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segunda-feira, outubro 22, 2012

Aniversário

Este blog hoje faz 8 anos.



Ao ver esta imagem há dias no blog do Observador, achei que se enquadrava perfeitamente para comemorar o aniversário.

Junto também um poema que gosto muito, de um heterónimo de Fernando Pessoa:

Para ser grande, sê inteiro: nada
Teu exagera ou exclui.
Sê todo em cada coisa. Põe quanto és
No mínimo que fazes.
Assim em cada lago a lua toda
Brilha, porque alta vive.

Ricardo Reis

Por fim não posso esquecer que este ano faleceram dois grandes amigos que me acompanharam desde o princípio:

A Grande Senhora Amélia Pais e o Grande Senhor Alien 8. Que os Deuses os guardem.


sábado, outubro 20, 2012

O beijo



Congresso de gaivotas neste céu
Como uma tampa azul cobrindo o Tejo.
Querela de aves, pios, escaracéu.
Ainda palpitante voa um beijo.
Donde teria vindo! (não é meu...)
De algum quarto perdido no desejo?
De algum jovem amor que recebeu
Mandado de captura ou de despejo?
É uma ave estranha colorida,
Vai batendo como a própria vida,
Um coração vermelho pelo ar.
E é a força sem fim de duas bocas,
De duas bocas que se juntam, loucas!
De inveja as gaivotas a gritar...

Alexandre O'Neill

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quinta-feira, outubro 18, 2012

A festa do silêncio



Escuto na palavra a festa do silêncio. 
Tudo está no seu sítio. As aparências apagaram-se. 
As coisas vacilam tão próximas de si mesmas. 
Concentram-se, dilatam-se as ondas silenciosas. 
É o vazio ou o cimo? É um pomar de espuma. 

Uma criança brinca nas dunas, o tempo acaricia, 
o ar prolonga. A brancura é o caminho. 
Surpresa e não surpresa: a simples respiração. 
Relações, variações, nada mais. Nada se cria. 
Vamos e vimos. Algo inunda, incendeia, recomeça. 

Nada é inacessível no silêncio ou no poema. 
É aqui a abóbada transparente, o vento principia. 
No centro do dia há uma fonte de água clara. 
Se digo árvore a árvore em mim respira. 
Vivo na delícia nua da inocência aberta.

António Ramos Rosa

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terça-feira, outubro 16, 2012

Velhos



O homem velho pouco dorme,
sabe que o tempo lhe escasseia
quando precisa habituar os olhos
aos grandes espaços vazios
e à escuridão.

Os pássaros calam-se
para que não se distraia.

Manuel Filipe, in"Via de Curetes", pág.33, Edição do Autor

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domingo, outubro 14, 2012

Lisa says:



"Quem verdadeiramente procura
nunca alcança,
e também se cansa."

Manuel Filipe, in"Via de Curetes", pág.62, Edição do Autor

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sexta-feira, outubro 12, 2012

Aqui eu te amo.



Nos escuros pinheiros se desenlaça o vento.
Fosforesce a lua sobre as águas errantes.
Andam dias iguais a perseguir-se.

Define-se a névoa em dançantes figuras.
Uma gaivota de prata se desprende do ocaso.
As vezes uma vela. Altas, altas, estrelas.

Ou a cruz negra de um barco.
Só.
As vezes amanheço, e minha alma está húmida.
Soa, ressoa o mar distante.
Isto é um porto.
Aqui eu te amo.

Aqui eu te amo e em vão te oculta o horizonte.
Estou a amar-te ainda entre estas frias coisas.
As vezes vão meus beijos nesses barcos solenes,
que correm pelo mar rumo a onde não chegam.

Já me creio esquecido como estas velha âncoras.
São mais tristes os portos ao atracar da tarde.
Cansa-se minha vida inutilmente faminta..
Eu amo o que não tenho. E tu estás tão distante.

Meu tédio mede forças com os lentos crepúsculos.
Mas a noite enche e começa a cantar-me.
A lua faz girar sua arruela de sonho.

Olham-me com teus olhos as estrelas maiores.
E como eu te amo, os pinheiros no vento,
querem cantar o teu nome, com suas folhas de cobre.

Pablo Neruda

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quarta-feira, outubro 10, 2012

Haiku



Mar agitado —
Estende-se até a ilha de Sado
A Via-láctea.

Bashô

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segunda-feira, outubro 08, 2012

Lenda dos Sonhos



Noite 
lenta, eterna, magia dos espíritos... 
Apalpo a distância do movimento... 
O brilho profundo do luar 
Aquece o gesto sentido do amor 
E transformo-te na lenda dos sonhos. 
As estrelas cantam o brilho sublime 
Dentro da ternura do teu olhar 
Reflectindo sobre a imensidão do oceano 
O calor sensual do teu abraço. 
Murmúrios delicioso povoam os céus 
Embalando a doçura dos teus beijos 
E o arco-íris eleva-se no horizonte 
Colorindo as ondas quentes dos teus cabelos 
Por onde navegam as verdades dos teus sentimentos. 
Os sentidos flutuam pelo aroma verdadeiro 
Da simplicidade da tua generosidade 
Criando a simbiose dos teus desejos. 
Na canção embriagante dos sinos celestiais 
Envolvo-me na tua sinceridade 
E torno-te eterna dentro do meu peito.


Jorge Viegas

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sábado, outubro 06, 2012

Soneto



Lábios 
que encontram outros lábios 
num meio de caminho, como peregrinos 
interrompendo a devoção, nem pobres 
nem sábios numa embriaguez sem vinho: 

que silêncio os entontece quando 
de súbito se tocam e, cegos ainda, 
procuram a saída que o olhar esquece 
num murmúrio de vagos segredos? 

É de tarde, na melancolia turva 
dos poentes, ouvindo um tocar de sinos 
escorrer sob o azul dos céus quentes, 
que essa imagem desce de agosto, ou 
setembro, e se enrola sem desgosto 
no chão obscuro desse amor que lembro. 

Nuno Júdice

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quinta-feira, outubro 04, 2012

Haiku




Bolha de sabão.
Borboleta distraída...
Colisão no ar!

Fanny Dupré

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terça-feira, outubro 02, 2012

Labirinto ou alguns lugares do amor



O outono 
por assim dizer 
                   pois era verão 
forrado de agulhas 

a cal 
rumorosa 
do sol dos cardos 

sem outras mãos que lentas barcas 
vai-se aproximando a água 

a nudez do vidro 
a luz 
a prumo dos mastros 

os prados matinais 
os pés 
verdes quase 

o brilho 
das magnólias 
apertado nos dentes 

uma espécie de tumulto 
as unhas 
tão fatigadas dos dedos 

o bosque abre-se beijo a beijo 
                                        e é branco 

.Eugénio de Andrade

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